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Alecrim aos molhos

alecrim
Moitas de alecrim espontâneo e cultivado.

Depois de uma visita à herdade de Vale Covo, no Alentejo, nunca mais voltarei a olhar para um óleo essencial, sobretudo de alecrim, com os mesmos olhos.

A companhada pela Patrícia Pedrosa e pela Ana Loutsenko, tinha como missão realizar um pequeno documentário sobre todo o processo de extração de óleos essenciais realizados pelo François Goris em pleno Alentejo, com o Guadiana serpenteando lá ao fundo entre penhascos e estevas.

O sítio

A paisagem, no verão, é árida, muito árida; o fim de tarde cheira a alecrim, a tomilho, a erva-do-caril, a funcho e a esteva, como não poderia deixar de ser. O som incansável das cigarras diz-nos que está calor, muito calor. Chegámos de véspera ao fim do dia, após uma viagem de 300 quilómetros. Depois de uma amigável conversa com o François, um banho na piscina ao pôr do sol e um jantar ligeiro, fomos dormir cedo porque o dia seguinte se adivinharia longo, muito longo: às 7 da manhã começava o corte do alecrim que, por volta das 11h, teria de estar dentro das cubas, pronto a ser destilado.

A colheita do alecrim

Destilaria com dois alambiques e respetivas tampas.

E assim foi. Depois de uma noite bem dormida, o galo acordou-nos antes das seis da manhã. Tomámos o pequeno-almoço e fomos para o campo, que o senhor Leopoldino já nos esperava de foice em punho. As matas de alecrim, todas plantadas pelo François, encontravam-se no outro lado do vale. Subimos para a pick-up com câmaras de filmar, microfones e vontade de trabalhar. Às 11h30, tinha de estar tudo cortado. Foi um ver se te avias, leira a leira, fomos cortando à foice o alecrim, que depois íamos transportando em grandes feixes até ao trator, onde se iam empilhando bem acamados, para assim caberem muitos. Trator cheio, e lá vai ele, e lá vamos nós atrás até ao topo da outra colina onde se encontra a destilaria com dois grandes alambiques à nossa espera.

A destilaria

Seguiu-se o descarregar do trator em grandes braçadas que iam preenchendo um dos alambiques até o mesmo estar completamente cheio e bem comprimido. Com a ajuda de uma roldana, coloca-se uma espécie de tampa compressora bem apertada sobre a qual se coloca a tampa fi nal, em forma de chapéu exótico, com um tubo que irá depois ligar-se a outro recipiente onde se encontra a serpentina de arrefecimento do vapor que irá sair por esse tubo. Na serpentina, dá-se a condensação do vapor resultante do processo de aquecimento do alecrim. Aquecimento? Pois, enquanto nós íamos preenchendo com plantas o interior do alambique, o François ocupou-se do fogo. Na cave, por baixo da cuba, arde um fogo constante que é alimentado a lenha da herdade, com 200 hectares trabalhados manualmente por dois homens; parece difícil de acreditar, mas é verdade.

Retirada do alecrim já desidratado e destilado.

O óleo essencial de alecrim

Ao meio-dia começou a destilação do primeiro alambique e, às 14h, de uma pequena torneira ligada à serpentina, saía o precioso hidrolato de alecrim, em cuja superfície se vislumbrava uma película de óleo essencial que teria de ser decantado: água para um lado (hidrolato) e óleo para outro. Ao fim de sete horas de trabalho conseguimos 1,5 litros de óleo essencial que, depois de um mês ou dois de pousio, será colocado em pequenos frasquinhos de 10 ml e vendidos no mercado ao módico preço de 8€, no caso do alecrim. O preço dos óleos varia de planta para planta.

O François, depois de uma cuidada observação do território há cerca de 20 anos, decidiu assim multiplicar as espécies vegetais locais e usá-las para a destilação de óleos essenciais, trabalho que tem feito bem ao longo destes anos. Diria que o seu ex-líbris é o óleo essencial de esteva. Grande parte é exportado para a indústria francesa, onde é muito apreciado, sobretudo como fixador de aromas. Confesso que o meu favorito é o alecrim e, agora que o ajudei a dar à luz, fiquei ainda mais fã destes delicados frasquinhos que trago sempre na mala para as mais diversas aplicações. Também gosto de Helychrisum, mais conhecido por erva-do-caril, do rosmaninho e do tomilho bela-luz (Thymus mastichina), conhecido, na zona de Mértola, por erva-ursa.

Como não poderia deixar de ser, com tanta erva aromática por perto, era um crime não ter colmeias. O François tem 100 colmeias espalhadas pela herdade e extrai um mel delicioso uma a duas vezes no ano.

Fotos: Fernanda Botelho

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