Revista Jardins

Lírio, o perfume que a terra esconde


Azul, amarelo, violeta, branco… o lírio floresce por todo o lado, independente e seguro de si, rivalizando com a própria orquídea na sua aristocrática postura e na sua ostensiva voluptuosidade.

Mítico e misterioso, o lírio é uma flor incontornável no universo dos aromas e da perfumaria.

Em francês, chama-se íris, relacionando-o com a sua génese poética que remonta à Antiguidade grega: as cores mutantes da flor evocam o arco-íris, que seria a veste preciosa da deusa egípcia Iris.

Por esta razão, a família botânica a que pertence é a das Iridiáceas.

A etimologia portuguesa, assim como a de outras línguas europeias, trouxe-lhe o nome de lírio, proveniente do latim liliu (com origem no grego leírion).

Esta flor tem um forte simbolismo em inúmeras culturas. A forma das suas folhas recorda as cimitarras sarracenas e, em tempos remotos, era plantado junto às campas dos guerreiros muçulmanos.

No Japão, é símbolo de fecundidade, fazendo parte de alguns rituais.

Na China, é símbolo de maternidade, subsistindo a crença de que sonhar com lírios na primavera é sinal de casamento, felicidade e prosperidade (se o sonho ocorre no inverno, é uma premonição nefasta).

De forma mais prosaica, o lírio foi utilizado na farmacopeia tradicional, mas também na produção de tinturas para vestuário e até na cosmética, para aclarar a tez.

Já na antiga Creta se apreciava o perfume do lírio, se observarmos as tábuas de Cnossos.

Mais tarde, no século XVI, esteve em grande moda, talvez impulsionado por Catarina de Médicis. Durante o Renascimento, impôs-se a moda das luvas perfumadas com pó de lírio.

Ainda hoje, o lírio é o fascínio de grandes criadores de perfumes, mas também artistas que homenagearam a sua beleza e cores. Foi o caso de Van Gogh, inspirado pelas gravuras japonesas de Hokusaï.

Uma flor livre e independente

As iridiácias contam com centenas de variedades e de espécies botânicas espalhadas pelo mundo. A paixão pelo lírio levou à multiplicação de híbridos, na busca de novas formas e cores.

Conforme a variedade a que pertence, o lírio pode resistir aos calores mais intensos ou viver junto à água ou até resistir à água.

No universo da perfumaria, a espécie mais utilizada é a chamada Iris pallida, a par da requintadíssima Iris fiorentina. Não existe relação entre o perfume da flor e do rizoma.

O perfume do rizoma é suave e profundamente requintado (perfume de violeta, delicadamente amadeirado, rico e leve, o que dá a famosa nota poudrée, isto é empoada).

Um perfume que vem da terra

O perfume do lírio provém do rizoma, mas apenas de alguns lírios entre a centena que existe.

Mas, em primeiro lugar, encontra-se indiscutivelmente o lírio florentino, que denuncia a sua pátria de eleição: Itália. Nos campos da Toscana, o lírio é cultivado e submetido a um processo artesanal relativamente longo e exigente.

É preciso esperar quatro anos para a sua primeira floração e para a sua colheita manual.

É necessário limpar o rizoma, utilizando uma faca curva, o roncolino, desenhada para se adaptar aos caprichos das suas formas. Segue-se a secagem em esteiras, durante 2-4 anos.

É durante este período que se desenvolve o irone, substância odorífera do lírio. Durante este tempo, os rizomas encolhem, perdendo dois terços do seu peso.

Tendo em conta que, depois da destilação, de um quilo de rizomas de lírio se consegue apenas dois a três gramas de manteiga de lírio. Percebemos que um quilo absoluto possa custar mais de 8000 euros.

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