Ornamentais

Com o jardim às costas

Como, no final do ano, passado mudei a minha “floresta” para o Ribatejo. As aventuras de mudar uma coleção botânica e construir um orquidário do zero, lutando e aprendendo com as agruras climáticas da nova zona.

Não é raro que, em épocas de crise, surjam oportunidades de mudança e por vezes só temos que estar lá, naqueles momentos-chave, abertos a essas ocasiões e com vontade de mudar. E foi isso que aconteceu. O aparecimento da covid-19 fez com que as nossas vidas dessem uma inevitável cambalhota no mês de março de 2020.

Todo o mundo foi afetado, todas as rotinas foram alteradas e socialmente acho que nunca mais vamos ser os mesmos. As precauções que tivemos de tomar e o estado de permanente alerta ao qual fomos submetidos deixarão mazelas durante muitos anos… Muito se perdeu, mas houve coisas que, sendo simplesmente sonhos ou hipóteses ridículas, tomaram outras dimensões e tornaram-se possibilidades e sonhos mais facilmente realizáveis. No entanto, algo não mudou: temos sempre de arriscar.

No final do verão do ano, passado estava a viver mais ou menos alarmado com a nossa saúde e o nosso futuro, entre confinamentos e a ouvir, vindas de várias fontes, histórias de amigos, conhecidos ou familiares que tinham sido infetados, uns com sintomas, outros sem. Alguns internados e, felizmente, no meu núcleo mais próximo, poucos falecimentos. Apesar de continuar a trabalhar, deixei de usar transportes públicos e a minha vida era uma maratona de casa-trabalho, sem ver os meus pais há meses e a passar o tempo livre em casa, o que até seria agradável noutras circunstâncias. O verão em Lisboa é calmo, mas a sensação geral era de claustrofobia e de isolamento numa cidade cheia de gente. Apetecia-me fugir dali.

E assim, entre conversas e sonhos, a ideia de “Viver no Campo”, que sempre esteve presente na minha vida como uma possibilidade utópica, tornou-se cada vez mais presente e plausível. Profissões que nunca ponderaram a condição de teletrabalho davam agora os primeiros passos nesse sentido, primeiro, por obrigação e, depois, por conveniência, porque até se descobriu que os resultados eram positivos.

Os obstáculos que me separavam de uma sonhada “Vida no Campo” foram sendo afastados e cheguei à assustadora fase em que nos perguntamos “Vamos?”. Passados poucos meses, no início de dezembro, tinha-me despedi-do do trabalho, tinha vendido o meu apartamento em Benfica e tinha na mão as chaves de uma vivenda algures no Ribatejo, num local onde eu, em 50 anos de vida, nunca tinha colocado os pés.

Parece simples, mas não foi, especialmente para alguém como eu que não se dá bem com mudanças. Quando olhei e me apercebi do que teria de mudar para outro local a 70 quilómetros de distância, fiquei um bocadinho em pânico. Foram 20 anos de vida em Benfica. E eu sou uma pessoa que gosta do seu espaço, dos seus objetos, móveis, livros e das plantas… como é que enfiei tantas plantas num terraço de 40 m2 em Benfica? Várias centenas de orquídeas, suculentas, Tillandsias, bolbosas, trepadeiras, arbustos e até algumas árvores. Por brincadeira, eu chamava-lhe “a minha floresta” e eram estes 40 m2 de verde, fora o conteúdo da casa, o que eu tinha que transportar para o Ribatejo.

  1. Construção do Orquidário
  2. Construção do Orquidário
  3. Construção do Orquidário
  4. Florações de Dezembro debaixo do alpendre
  5. Entrada do Orquidário
  6. Interior do Orquidário

A mudança das plantas

Foram dias de sofrimento, pois muitas plantas tiveram de ser cortadas e retiradas do seu estado de crescimento meio selvagem. Algumas foram empacotadas. Outras desenraizadas. E, por outro lado, algumas que julgava perdidas foram encontradas. Mas todo este “mexer” no que estava estabilizado há anos causou-me muita ansiedade. Nem querem imaginar as caras dos homens das mudanças quando viram o que havia para mudar! Após o choque inicial, tudo correu bem e, além do recheio do apartamento, conseguimos encher uma carrinha, dois SUV e um camião TIR de plantas.

Uma verdadeira floresta tropical em movimento! Nada estava preparado na nova casa. Tinha espaço e o plano era espalhar as plantas de jardim no jardim e no pátio nas traseiras. No início, ficou tudo meio amontoado e muito lentamente fui desbravando as centenas de vasos espalhados que foram “arrumados” num local para passarem o inverno e tudo se iria fazer aos poucos, até porque eram prioritárias as mil tarefas que tinha de fazer na nova casa. Agora já não estava na zona temperada e protegida pelos prédios de Benfica e não foi preciso muito tempo para sentir a experiência de seis semanas de fortes frios e geadas. Bem-vindo ao clima do interior do País!

Segundo os locais, há cerca de uma década que não se sentiam temperaturas tão baixas e tanta geada. E as minhas orquídeas tropicais estavam todas na rua e outras foram colocadas na garagem, praticamente ao escuro. Só quem coleciona plantas pode compreender os dias de aflição quando comecei a ver as plantas a ficarem queimadas do frio, mesmo as que tinham estado no exterior toda a sua vida.

O ano de 2021 será, pois, um ano de recuperação e de começar do zero. Muitas plantas ficaram danificadas, mas continuam vivas. É espantosa a capacidade de sobrevivência das plantas e especialmente das espécies tropicais. Algumas plantas que já tinha há décadas ficaram reduzidas a um terço, mas é impressionante observar a recuperação e a rapidez com que começaram a desenvolver novos rebentos assim que a primavera começou a dar sinais de si. E assim algumas centenas de vasos mudaram de local duas ou três vezes. A minha vida durante meses foi carregar vasos, proteger do frio, proteger da chuva. Tirar daqui e colocar ali, porque o sítio podia ser melhor ou porque as obras o exigiam e depois tinha de voltar a arrumar tudo de novo.

Uma prova também para mim de resistência, sanidade mental e muita paciência. A mudança de 70 quilómetros para nordeste levou a que eu tivesse de aprender de novo a cultivar as plantas que tinha há anos comigo e a lutar contra a continentalidade, temperaturas abaixo de zero e uma maior exposição aos elementos. Mas, na jardinagem, como na vida, tudo é uma aprendizagem.

O NOVO PROJETO: SIGNIFICADOS – SENTIMENTOS

Entrando em 2021, ao mesmo tempo que eu e o mundo ainda lidávamos com uma pandemia, mantive-me distraído com todo o trabalho de me ambientar ao novo espaço e planear a construção de um orquidário onde pudesse alojar a minha coleção de orquídeas e outras plantas tropicais bem como as plantas que iriam chegar no futuro para a minha loja online. Tinha já para o efeito criado uma empresa, a Greenman, Lda., e seriam esses os meus projetos laborais para o futuro. Trabalhar com plantas no meu próprio espaço. Em casa!

O nome Greenman (Homem Verde, na tradução literal) surgiu na minha paixão por um símbolo medieval, presente em muitos edifícios e igrejas góticas de toda a Europa e representado por uma cara simpática, meio humana, meio botânica, cuja pele é substituída por folhas, e que simboliza a Natureza, a fertilidade, o renascimento e, como nas estações, a mudan-ça. Nada mais adequado.

A construção do orquidário já está pronta. Como todas as obras, levou mais tempo do que o estimado, mas estou satisfeito e sinto-me muito bem naquele espaço feito à medida para o tipo de plantas de que gosto, onde sei que vou passar muito tempo, mas vou aprender muito e onde me sinto em casa e confortável.

Quero deixar aqui os meus agradecimentos a quem me apoiou nesta minha aventura. Sem o incentivo de muitos amigos, não sei se teria dado o primeiro passo nesta jornada. Resta-me deixar aqui o convite a todos para passarem pela minha loja online, em https://greenman-orquideas.pt e verem o que tenho para vos oferecer.

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