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Itinerário pela Escócia

Charles Jencks no Modern One em Edimburgo

Mal saímos da capital escocesa, ficamos rodeados de um lado e outro da estrada por campos verdes, daqueles que admiramos nas fotografias que nos mandam pela net, pontuados por ovelhas, carneiros, vacas e bois que, tranquilamente, se deleitam na abundância das pastagens naturais.

Não admira, já que o número de ovelhas ronda os 6 700 000 e o gado vacum 1 800 000, bastante mais que a população humana que pouco ultrapassa os cinco milhões. Só encontrei uma situação parecida na Nova Zelândia, onde, de resto, se tem a mesma sensação de libertação do mundo constrangido da cidade. A vantagem da Escócia é que está apenas a três horas de Lisboa.

Pormenor da composição de Jencks

Se percorrermos o território escocês da costa leste para os Highlands, a oeste, com a exceção de Glasgow, a sensação que se tem é de estarmos permanentemente “no campo”. A ausência de autoestradas, os percursos constantes por veredas — as leafy lanes — e as pequeninas vilórias intocadas pela modernidade constituem um calmante de efeito prolongado.

A austeridade de um clima frio e as fachadas dos edifícios em pedra ou pintadas de uns tristes cinzentos ou castanhos (não são permitidas fantasias arquitetónicas em nome da preservação da paisagem) fazem com que jardins e flores tenham um importante destaque no exterior das casas. De tudo se faz um imaginativo arranjo de flores que alegra fachadas, ruas, candeeiros, janelas.

Gradeamento da Universidade de St. Andrews

Este ano, em St. Andrews, predominavam, julgo que por diretiva municipal, os tons de encarnado e azul, que, como que num acordo tácito generalizado, foram seguidos por toda a população. O rigor do clima com fortes nevões no inverno e a predominância de árvores de folha caduca, arrastam para oito meses a cinzento e branco com dias que escurecem a partir das 16h30. Enfim, o oposto dos nossos ambientes luminosos e ensolarados.

Mas, talvez por isso mesmo, os meses de junho a setembro são, na Escócia, uma festa para os amadores da jardinagem com jardins privados abertos ao público por um dia (as entradas revertem a favor de charities), festivais, feiras, exposições, etc. A exibição do jardim de cada um é um ponto de honra, já que por estas bandas não há equipas de jardinagem a cuidar deles. São os proprietários que, até idades bem avançadas, cortam a relva, adubam, limpam, podam, semeiam, estacam e plantam. As intervenções dos profissionais reduzem-se a um corte das árvores de grande porte quando absolutamente necessário.

O famoso relógio florido de Edimburgo

Os espaços de Charles Jencks

Durante a semana que lá estive, fiz a minha habitual incursão a Edimburgo para visitar alguns museus e apanhar os finais do famoso Edinburgh Festival, agora de tendências alternativas.

Nunca tinha ido ao Modern One e ao Modern Two, abreviaturas de Scottish National Gallery of Modern Art, parte integrante de quatro museus sob a alçada das National Galleries of Scotland.

Logo que cheguei ao Modern One, esqueci ao que vinha, porque me deparei logo à entrada com o traço inconfundível do arquiteto paisagista americano Charles Jencks no entorno do edifício do museu. Jencks é famoso em todos os livros de arquitetura paisagística pelo jardim de 12 hectares da casa de família, na Escócia, perto de Dumfries, completado em 2003, que faz jus ao seu nome: The Garden of Cosmic Speculation.

O jardim também é conhecido pela sua inacessibilidade já que só abre ao público um dia por ano (em 2016, abriu entre as 12h e as 17h, a 1 de Maio). Mas o génio de Jencks está disponível para todos logo à entrada do Modern One, com as suas características “paisagens onduladas”, sem flores, constituídas apenas por ondulações em espiral cobertas de relva e entremeadas por lagos com água, numa composição realizada, em 2002, para a reabertura do museu. A sua formulação matemática na utilização de grandes espaços remete-nos efetivamente para a tal “especulação cósmica” e para lá fiquei a admirar a obra, quase esquecida que a ideia da visita era o interior do museu.

Curiosamente, a Escócia, tão aparentemente conservadora na sua preservação paisagística, alberga alguns dos mais interessantes e arrojados jardins contemporâneos europeus: os de Charles Jencks e o misterioso Little Sparta, de Ian Hamilton Finlay.

Fotos: Vera Nobre da Costa

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