Jardins & Viagens

Conheça a flora de Madagáscar

Há cerca de 200 milhões de anos, a deriva dos continentes separou uma pequena parte de terra entre o que viriam a ser a futura Índia e o continente africano. Assim nasceu a quarta maior ilha do mundo – Madagáscar – cujos habitantes ancestrais, a sua fauna e flora, evoluíram afastados de tudo, criando espécies únicas e muito originais!

Em setembro, tive a oportunidade de passar duas semanas nessa magnífica ilha numa das minhas viagens de grupo, as Greentrips – viagens para visitar as jóias naturais do nosso planeta.

Vanilla planifolia

É impossível viajar para um destino como Madagáscar sem associar a extrema pobreza da população ao excessivo uso dos seus recursos naturais. A ilha está esgotada. A terra é utilizada sem planeamento nem controlo. É difícil implementar ideias ecológicas quando grande parte da população apenas sobrevive do pouco que tem e do que consegue tirar da natureza.

Ao longo dos muitos quilómetros que percorremos na zona central, de Oeste para Este, pudemos presenciar o desgaste da terra que outrora foi verde e luxuriante e hoje está desertificada, transformada em campos de plantações de árvores de crescimento rápido (para serem ardidas para fazer carvão) ou em campos de arroz.

Jumellea sp

Madagáscar tem hoje dez por cento da sua floresta e desta só cerca de um por cento é considerada floresta primária, ancestral. Essa floresta está hoje protegida e encontra-se distribuída em áreas isoladas praticamente por toda a ilha, como grandes oásis num deserto árido. São florestas lindíssimas, habitadas por seres fantásticos e que nos levam a imaginar como seria Madagáscar quando os portugueses ali chegaram (a meio caminho das Índias) no ano de 1500.

Os gigantes

O voo de Paris levou-nos para a capital, Antananarivo, onde só estaríamos algumas horas até ao voo seguinte para Morondava, um desvio para uma área seca e muito castigada, mas essencial na nossa visita. Queríamos conhecer os gigantes anciãos de Madagáscar.

Não podíamos deixar de visitar a Avenida dos Baobás. Os exemplares maiores e mais majestosos estão avaliados como tendo mais de 2000 anos. São mais de 200 exemplares de grande porte, com cerca de 30 metros de altura ao longo de uma estrada rudimentar com mais de 2500 metros de comprimento.

Baobas

A espécie dominante é a Adansonia grandidieri, endémica de Madagáscar; podendo também ser encontrados neste local alguns exemplares das espécies Adansonia rubrostipa e Adansonia za. São árvores impressionantes, sublimes e esperar pelo magnifico pôr do sol para fotografar os baobás ao crepúsculo foi uma das experiências que dificilmente esquecerei.

O evoluir da paisagem

Durante os vários dias seguintes, o grupo viajou em dois miniautocarros por estradas esburacadas, umas alcatroadas, outras não, desde Morondava, a Oeste, com diversas paragens, até ao Paraíso dos lagos da costa Este, separados do oceano Índico por uma fina língua de areia.

Carnivoras Nepenthes madagascarensis

Nessa longa viagem, sempre acompanhados de locais a pé, rebanhos de zebus, os mais diversos veículos motorizados carregados de tudo o que é possível imaginar (patos, carvão, cereais, tijolos, etc.), fomos vendo a alteração da paisagem. No início, mais plana e seca, quase só com alguns arbustos, e, depois, com algumas elevações já trabalhadas em socalcos e transformadas em campos de arroz, o alimento da dieta-base de Madagáscar.

No campo dos frutos a banana é a rainha, logo seguida dos ananases. Madagáscar tem a espécie mais rara de banana, a Ensete perrieri, uma parente próxima da banana cultivada em todo o mundo; mas vimos vários tipos de bananas à venda, assim como papaias, anonas, mangas, maracujás, cocos e as deliciosas jacas. É engraçado como as plantas estão espalhadas por todo o mundo. Nos jardins, encontra-se de tudo, buganvílias, azáleas, várias espécies de palmeiras, muitas árvores-do-viajante (Ravenala madagascariensis), endémicas de Madagáscar. Como proteção contra intrusos, junto a muros ou como sebes, é muito comum encontrar as bonitas Euphorbia milli.

Bulbophyllum françoisii

Quando chegamos à zona central de ilha, a paisagem muda de novo, tornando-se mais acidentada e mais arborizada. Ao longo de toda a viagem, fomos vendo fogos florestais sem qualquer controlo. O guia riu-se quando estranhámos nunca termos visto um bombeiro. São os locais que deitam fogo à mata. A madeira ardida é muito importante para a produção de carvão que se vende ao longo das estradas e nas feiras, a principal fonte de combustível para os locais.

A floresta secundária (plantada) é composta principalmente por espécies exóticas, pinheiros da zona do México e eucaliptos australianos, as espécies são diferentes das que temos cá, os eucaliptos têm uma casca grossa e rugosa, não ardem tão facilmente.

Uma zona importante é a região Col de Tapia, perto de Antsirabe, onde encontrámos as florestas de tapias (Uapaca bojeri), que resis- tem ao fogo devido à sua casca espessa. Lembram um pouco os nos- sos sobreiros e os seus frutos, os Voapaka, são comestíveis. Depois de tanta terra vermelha e seca, as florestas montanhosas e chuvosas da costa Este são completamente diferentes e foram saudadas com agrado pelo seu verde. Vários tipos de Ficus, lianas, fetos, bambus e tantas outras plantas de clima tropical húmido compõem estas florestas mais cerradas e coloridas.

Frutos de Baobas

Aí também a fauna é muito mais diversa e tivemos oportunidade de ver lémures, aves, camaleões e outros répteis em liberdade nos parques naturais de Ranomafana e de Andasibe-Mantadia. Mais uma vez, mudámos de paisagem e de Brickaville seguimos de barco pelo canal fluvial Pangalanes. Atravessamos o lago Rasoabe até à ilha de areias brancas e águas mornas de Akanin’ny Nofy (quer dizer “Ninho dos Sonhos”), rodeada pelo lago Ampitake. E é mesmo um sonho. Casas de madeira, palmeiras na praia, frutos tropicais, o som dos chamamentos dos lémures à distância e plantas exóticas, entre elas as carnívoras Nepenthes madagascarensis e Nepenthes masoalensis, numa margem pantanosa do lago e orquídeas, muitas orquídeas…

Orquídeas de Madagáscar

Tal como acontece na fauna e restante flora desta zona insular, a família Orchidacea está muito bem representada em Madagáscar. Aqui podemos encontrar cerca de mil espécies de orquídeas, sendo que noventa por cento dessas espécies são endémicas.

Arachnis num jardim

Inicialmente, antes de chegarmos às florestas, as únicas orquídeas que encontrávamos estavam plantadas nos jardins por onde íamos passando e aí, curiosamente e como já aconteceu em outros países, só encontrávamos espécies exóticas que não eram originárias de Madagáscar, Epidendrum da América do Sul, Coelogyne cristata, dos Himalaias, Dendrobium, Arachnis e outros géneros asiáticos. No entanto, assim que fomos para os parques naturais das zonas tropicais, os guias botânicos que nos acompanharam mostraram-nos várias espécies endémicas e outras mais conhecidas na floresta.

Um género bem representado em Madagáscar são os Angraecum. Tivemos sorte de ser a época de floração dos Angraecum sesquipedale (a orquídea-estrela, também conhecida como a orquídea de Darwin) e do Angraecum eburneum, conseguindo ver, em vários sítios, bonitos exemplares em flor.

Cynorkis lowiana

Outras que vimos pela primeira vez foram os Bulbophyllum françoisii, Bulbophyllum analamazoatrae, Bulbophyllum auriflorum e o fantástico Bulbophyllum ocultum.

Quando andávamos a procurar camaleões numa parede rochosa que escorria água, um meio completamente alagado, encontrámos umas dezenas de Cynorkis lowianatambém em flor, que localmente são chamadas “bailarinas”.

Aprende-se sempre muito ao vermos orquídeas e outras plantas a crescerem nos seus habitats naturais. Aí podemos ver as condições que preferem e que nos levam depois a aperfeiçoar os cultivos dessas plantas nas nossas casas.

Outra das orquídeas que fomos encontrando por toda Madagáscar foi a planta-da-baunilha, a Vanilla planifolia. Esta espécie apesar de não ser originária de Madagáscar, é produzida ali em grande quantidade.

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