Trilhos que nos levam paisagem adentro.
A paisagem da Costa Vicentina tem uma beleza singular que deve ser vivida num ritmo lento. Numa região por vezes esquecida, surgiu uma associação que quer dinamizar a economia, tirando partido da paisagem ao mesmo tempo que contribui para a sua conservação. Marta Cabral, presidente da direção da Associação Rota Vicentina, explica-nos como encontrar o equilíbrio para a sustentabilidade.
Qual é o propósito da Associação Rota Vicentina?
O sudoeste de Portugal com assuas áreas protegidas é um território vasto e singular, com o turismo como potencial catalisador do seu desenvolvimento integrado, próspero e inspirador.
A Associação Rota Vicentina propõe-se a unir forças na construção e atualização de uma oferta turística responsável em torno da rede de trilhos que a conecta, para servir a terra, a comunidade e a afirmação da nossa identidade.
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Como conseguem atrair turismo e ao mesmo tempo mantê-lo sustentável?
Passa muito por trabalhar na estruturação de uma oferta equilibrada, com a cooperação entre empresas e pessoas locais. As empresas procuram o lucro de uma forma que alimente todo o sistema e a comunidade. Procuramos responder com uma linha condutora, tempo para articular conhecimento, desafios, vontades e oportunidades. Em simultâneo, trabalhar a comunicação para que a mensagem chegue aos mercados que realmente importam, os turistas mais conscientes e com vontade de se sentir parte de um sistema saudável e próspero. Se o mundo já nos confronta com tantos desequilíbrios na nossa vida, as férias são para muitas pessoas uma forma de poder realmente relaxar e usufruir.
O que distingue a Costa Vicentina?
O oceano Atlântico, as falésias selvagens, os espaços tão diversos, uma forma de vida mais pausada, esta ligação tão única entre a serra, o campo e o mar.
Quais são os elementos paisagísticos e patrimoniais que devemos visitar?
Aproveitar a diversidade! O mar é magnético, mas complementar esse elemento com alguns recantos menos expostos pode ser uma linda surpresa. As aldeias e as suas ruas e comércio, as florestas para uma caminhada ao nascer do sol, os mercados e eventos que juntam a comunidade local e os visitantes, os rios e as ribeiras para tomar banho ou fazer alguma atividade, um passeio de bicicleta pelos campos ao final do dia, alguns museus e monumentos que contam histórias e explicam muito do que vemos.
Que tipo de rotas existem?
Para caminhar, o Caminho Histórico pelas aldeias, campos e serras, ligado às antigas peregrinações pelo território; o Trilho dos Pescadores, ao longo da costa e pelo meio dos pescadores, que pode também ser feito em pequenos troços ida e volta, sem pressas ou objetivo; os Percursos Circulares, que facilitam a logística porque começam e terminam no mesmo lugar, geralmente no centro de uma aldeia, mais curtos e sempre diversos e com temas ligados à identidade local.
Para fazer de bicicleta, temos o traçado longitudinal de touring bike e também de gravel, complementados com uma rede de BTT muito extensa, com vários circuitos para vários níveis de dificuldade. Tudo disponível no nosso website e de livre acesso.
Dão algum apoio complementar?
O apoio que damos é feito através das empresas parceiras da Rota Vicentina, que asseguram a vitalidade do projeto e se comprometem coletivamente com princípios de qualidade. As empresas e os seus serviços estão no nosso website.
Uma das vossas missões é a conservação ambiental. Que iniciativas têm?
Promovemos práticas que não destruam o equilíbrio ambiental e que valorizem economicamente os produtos e serviços que melhor contribuam para esse equilíbrio. No desenho dos percursos queremos cumprir as expectativas dos caminhantes, mas protegendo troços realmente vulneráveis. Incentivamos as empresas a oferecer programas diversos que apresentem ao visitante os recursos locais, acreditando que a informação é a melhor forma de conservação. Também fizemos um projeto-piloto de controlo de espécies invasoras em alguns pontos-chave da costa, que estamos a monitorizar com o nosso programa de voluntariado.
Pela sua experiência, qual é o estado de conservação desta paisagem?
O estado de conservação é difícil de definir, mas o ritmo de degradação preocupa-nos muito. Verificamos que, na prática, não há uma estratégia de proteção, recuperação ou contenção.
Conhecemos bem o conflito existente com o crescimento exponencial da agricultura intensiva de regadio no perímetro de rega do Mira e a falta de monitorização dos seus impactos. Monitorizamos cientificamente os percursos e os impactos dos caminhantes e verificamos que a degradação se verifica especificamente junto aos locais onde as estufas estão instaladas, por exemplo.
Quais são os ecossistemas, as plantas ou os animais mais vulneráveis?
Os ecossistemas mais vulneráveis serão os costeiros, incluindo as charcos temporários e os ripícolas, sendo que na costa temos várias espécies ameaçadas que verificamos estarem a regredir. Mais relevante podem ser as espécies invasoras. Destacaria as acácias, os chorões, os lagostins ou as canas.
Do ponto de vista da gestão da paisagem, quais são os limites do turismo e dos interesses económicos que considera intransponíveis?
Diria que muitas vezes o bom senso seria um ótimo limite. Quando uma atividade económica põe em causa a qualidade de vida dos habitantes locais, por exemplo, deve haver uma reflexão profunda. Ou os valores naturais, ou outra atividade económica instalada e em equilíbrio. O limite é mesmo a falta de diálogo, muitas vezes.
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