Três horas e meia de comboio separam Londres do Lake District, situado na região de Cúmbria, a noroeste de Inglaterra. São três horas e meia em que somos transportados da confusão urbana, através de uma paisagem desinteressante, para a região mais bonita de Inglaterra. Os lagos (the lakes) são afins da paisagem escocesa na sua verdura tranquila pontuada pelas esculturas em movimento que são as ovelhas e carneiros, com lagos sem fim rodeados de montanhas, mas mais, muito mais arborizada.
Não vi prédios nem edificados ofensivos, apenas pequenas vilórias, todas semelhantes, saídas de quadros do século XVIII, com as suas casas forradas a pedra, todas com uma arquitetura homogénea. E, claro, não há montinhos de pedras à beira da estrada, nem lixo visível, nem nada que ofenda o olhar. Um descanso. Por isso mesmo, não é por acaso que por aqueles lados Woodsworth e Ruskin tenham procurado inspiração fugindo ao bulício de Londres.
O objetivo da minha ida ao Lake District não era o descanso, mas sim visitar, ao longo de cinco dias, alguns dos seus jardins em casas senhoriais (modestamente designadas por hall). Embora não tendo a imponência dos palácios de Stowe, Bleinheim ou Hampton Court, são dignos de visita pela sua belíssima conceção e manutenção imaculada.
Levens Hall
Ao longo de cinco dias, visitei dez jardins e mais havia para explorar. Foi graças à disponibilidade de Chris Crowder, há 30 anos o head gardener de Levens Hall, que me abriu portas e proporcionou conversas com os donos dos jardins ou com os responsáveis pela sua manutenção. E, se todos os jardins permitem aos jardineiros alguma criatividade e mão livre para modificações, Levens Hall é o único jardim verdadeiramente “histórico” que observei, no sentido em que toda a sua composição se mantém imutável. Por essa razão é também designado como “o único sobrevivente” do século.
Visualmente, o Levens Hall é surpreendente com as suas bizarras topiárias muito ao gosto do século XVII que decoram o jardim formal junto à casa. O trabalho de Crowder é de enorme responsabilidade já que se trata de uma manutenção das formas do passado, limitando a aventura criativa à plantação de diferentes espécies de cada estação nos canteiros dos parterres oferecendo diferentes esquemas cromáticos todos os anos. Mais exuberantes que os canteiros originais, os atuais oferecem um colorido que as câmaras fotográficas agradecem. No entanto o nosso olhar nunca descola das mais de 100 topiárias pouco geométricas de formas arredondadas a lembrar a cabeça de Homer Simpson ou evocando peças de xadrez.
Lowther Castle
Completamente opostos no estilo e no conceito são o castelo e o parque de Lowther. Este, sim, um castelo do século XVII, mas que atualmente é apenas uma romântica ruína, da qual só sobreviveu a fachada. Votado ao abandono durante anos, foi opção dos proprietários destruir todo o edificado, mantendo apenas restos das paredes exteriores para não terem de pagar os impostos devidos relativamente um castelo em estado habitável.
A dimensão da propriedade, 202 hectares, e a falta de recursos financeiros levaram a uma estratégia de preservação da decadência, onde a opção foi restaurar apenas determinadas zonas do parque, sendo que o visitante em nada perde em termos do encanto da experiência. Frente à fachada situa-se um espetacular parterre contemporâneo, da autoria de Dan Pearson, um muito na moda garden designer, jornalista e apresentador de televisão. A visão do contraste entre o aspeto fantasmagórico das paredes em ruína e o maravilhoso parterre intriga qualquer um. Só fiquei com pena de terem retirado uma plataforma elevada que permitia admirar o parterre de cima.
À saída encontrei umas senhoras de idade avançada que, munidas de instrumentos próprios, escarificavam o relvado/prado e tiravam ervas daninhas dos canteiros. Curiosa face ao seu papel naquele contexto, não resisti a meter conversa com elas. Eram professoras e funcionárias de Estado já reformadas que dedicavam quatro horas por semana a trabalho voluntário no castelo de Lowther. Muito bem-dispostas e rindo-se do meu espanto, acrescentaram que também tinham os seus próprios jardins para cuidar sem ajuda externa e, por isso, não podiam dar mais horas de trabalho voluntário. Mas que bela lição de vida.
Fotos: Vera Nobre da Costa
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