Jardins & Viagens

Flores, Faial, Graciosa e Terceira

A Europa estende-se muito para além do conhecido no paraíso despercebido que a Natureza açoriana tem.

Ambiente inundado de Natureza original que o Homem tocou, interferiu e até provocou, continua com tão vasto poder paradisíaco que não apaga a visão da perfeição. Sim, leem-se inúmeras introduções na vegetação, nenhuma capaz de desvirtuar a bondade da beleza da ilha. O encontro do mar com terra firme tem ocasionalmente vistas demasiado deslumbrantes e não menos vezes semelhantes entre si. Ilha das Flores, ilha do Faial, ilha Terceira e ilha da Graciosa serão apresentadas do ponto de vista botânico: espécies existentes, sejam introduzidas ou autóctones, ornamentais ou selvagens.

A Natureza cenariza formações muito poderosas se avaliarmos a originalidade e a estética da paisagem vegetal. É este tema que aqui proponho descobrir em quatro das nove ilhas açorianas. A primeira abordagem foca-se na ilha das Flores. Na redundância de imagens, mostro quanto aprecio o cruzamento de vistas que aludam a paisagens e episódios distantes e não nativos, mas cuja mescla – quanto mais inesperada, mais intensa mesmo que não se mostre tão bela – resulte na adaptação de espécies que habitualmente não seriam expectáveis.

Verdura predominante sobre a abundância de água que dela brota e dela se sacode ao mesmo tempo. Não há parcela de terreno nem área disponível que não seja coberta de vegetação, sobretudo por uma grande variedade de pteridófitas nativas como a Culcita macrocarpa, Osmunda regalis e a incrível Woodwardia radicans, que projetam as suas frondes com grande sintonia. O espetáculo é muitíssimo poderoso e completa-se a cada centímetro com tapetes de Selaginella kraussiana, oriunda de África com ocorrência natural nos Açores. Quando, no final do percurso, me deparo com as magníficas múltiplas quedas de água, suspendo a respiração perante tamanha encenação. Fabulosa criação natural talvez única em Portugal, ímpar em tudo o que já conheci.

A bordejar o lago, amontoam-se inúmeros exemplares de Colocasia esculenta, o taro ou inhame, nativo do sul da Índia até à China do Sul, naturalizou-se nas ilhas sendo diluído na cultura local. O brasão da Ribeira Seca, na Calheta, que apresenta um inhame dos Açores, exemplifica a aculturação da espécie alóctone na cultura insular. A imagem das grandes folhas da espécie ao longo das margens do lago leva-nos a paisagens do Sudeste Asiático, tornando esta ilha um fervilhante cenário de interessantíssimas paisagens comparadas.

Com alguma surpresa pude confirmar que no arquipélago não existem numerosos exemplares de Phoenix canariensis, como esperaria, ou melhor suporia, de tão habituado que estava a ver a paisagem continental portuguesa e madeirense preenchida com indivíduos que se multiplicavam de modo subespontâneo até à devastação causada pelo escaravelho-vermelho. Contudo, e embora nos Açores o escaravelho não tenha sido reportado, avistei relativamente poucos exemplares desta espécie. A surpresa foi rapidamente substituída pelo espanto ao deparar-me com incontáveis exemplares de híbridos, todos de belíssimo porte, adultos e impossível de definir quais as espécies cruzadas que deram origem à lista de exemplares que aqui trago.

São todos magníficos indivíduos, alguns com o estipe inclinado por força dos ventos dominantes e que lhes empresta uma forte semelhança ao Cocos nucifera, sobretudo aqueles que se desenvolvem exatamente na orla costeira. Vaticino sem qualquer certeza que entre estes exemplos existe parentesco com Phoenix reclinata, Phoenix rupicola e Phoenix roebelenii, possivelmente com P. canariensis. Na incerta conclusão de atribuir identidade às palmeiras, fiquei rendido à extraordinária beleza de todos os exemplares híbridos e com muito lamento não os vejo comercializados. Pude constatar a frutificação de cada um, o que me ajudou a eventualmente distinguir a origem do parentesco. De notar que estes exemplares hibridizados são muitíssimo rústicos, tal como a Phoenix canariensis, tendo, por essa razão, uma larga abrangência territorial em Portugal continental. Uma excelente proposta para jardins com design ou tempero tropical em zonas onde a lista de espécies é redutora, imposta pelas condições ecológicas.

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