Sonho tricentenário de uma família com raízes holandesas, atravessa gerações e, com o carinho de uma família portuguesa e a visão e empenho de uma equipa apaixonada, renasce e abre-nos as portas em todo o seu esplendor e fausto barroco.
António Cremer, “Cavalleiro Professo na Ordem de Christo, Intendente e Administrador das Fabricas da Pólvora deste Reino, e sua mulher, D. Catarina Van Zeller”, são os construtores e encomendadores da Quinta da Conceição, descendem de duas famílias holandesas que chegaram a Portugal nos finais de seiscentos e princípios de setecentos, e se notabilizaram, através de serviços, nomeadamente na sequência
da Guerra de Sucessão Espanhola (1702-1714),e na modernização das Fábricas da Pólvora de Alcântara e Barcarena. A casa e a Ermida de Nossa Senhora da Conceição foram iniciadas e sagradas com a primeira pedra a 1 de maio de 1715.
O projeto setecentista
A curta distância do porto estuarino de Coina chegava-se de Lisboa por barco, através da vala real, ao jeito dos canais dos Países Baixos. A casa domina a paisagem com a torre lanternim, característica dos palácios holandeses, e estabelece uma perfeita simetria, de todo o edificado. A simbologia temática conta-nos estórias logo na porta de entrada, encimada pelo nicho de Nossa Senhora da Conceição, coroada na Restauração de 1640, logo acima uma cartela com duas âncoras entrecruzadas e, já no frontão triangular, o leão calcando os canhões e apertando na mão um feixe de setas, tudo alusões ao almirantado, à pólvora e à guerra.
Estes cenários majestosos têm o seu ponto alto na contraposição paisagística entre as casas das duas quintas dos Cremer, a Conceição e o Peru, cabeça do morgadio. A implantação dos edifícios foi projetada com um extenso eixo reto ao jeito de uma alameda longa, com mais de um quilómetro, que liga as duas casas, tudo centrado paisagisticamente na torre lanternim da Quinta da Conceição.
A monumental obra dos Cremer foi digna de duas visitas da família real e do Magnânimo D. João V, ainda em 1715, com o projeto da Conceição em início, e, em 1727, com a rainha D. Maria Ana de Áustria e os príncipes. Segundo registos, o rei foi saudado por nove tiros de canhão e foram-lhe servidos refrescos. Esta receção dos Cremer à família real prova a curiosidade suscitada por este projeto nas terras da Conceição e Peru.
Já conhece o Convento dos Capuchos?
A horta e o pomar ajardinado
Ainda hoje sentimos a ancestralidade na modelação do espaço ajardinado e no ordenamento axial que envolve a casa, e a colina onde foi construída. O desenho centra-se nas imponentes escadarias, na praça retangular do pátio, com portão de cantaria e a torre do pombal, tudo organizado de uma forma cenográfica, que se prolonga pelo tanque de rega trapezoidal, e logo abaixo, o ninfeu com fonte central e lago, como que uma sala ao ar livre envolvida pela arcaria do aqueduto abastecido por poço e nora.
Hoje
A casa de 800 m2 e a quinta de 50 hectares de terrenos agrícolas, olivais e de uma mata secular de sobreiros zambujeiros e flora mediterrânica são geridas como uma unidade hoteleira de turismo rural.
O programa de reabilitação iniciou-se há cerca de uma década, pela mão da família Madeira Rodrigues, atuais proprietários, João Vasco, Catarina e Rita, pai e filhas são os mentores e promotores deste magnífico projeto que deu uma nova cara à quinta, que durante estes 308 anos de existência passou por períodos de fausto, mas também de muito abandono, pelas mãos dos sucessivos proprietários. O que hoje podemos apreciar e sentir deste passado norte-europeu só é possível graças à equipa de técnicos e apaixonados, cuidadores e reconstrutores, liderados por um inglês filho de pai suíço e mãe holandesa, Matt Gruningen. Pela sua visão tudo respira bom gosto, sensibilidade, rigor e um compromisso de amor incondicional pela quinta, pela casa e pelos jardins, tudo brilha e resplandece através do seu trabalho, e da sua equipa.
A caminho do futuro
Lê-se no site de apresentação do projeto turístico e cultural da Quinta da Conceição (ver aqui) que se espera celebrar os 400 anos desta visão dos Cremer, e tudo indica que essa data será celebrada sobre a égide do belo e da harmonia que esta a equipa tem desenvolvido meritoriamente.
Os proprietários e a equipa convidam não só para um hotel, mas para uma partilha, onde os hóspedes e convidados se sintam em casa e possam sentir a harmonia, o ambiente e a paisagem, subjacente à propriedade, à casa e aos jardins.
Que o diga a fantástica ideia do Centro de Retiros e dos seus cursos artísticos, ioga e terapias, workshops de criatividade, culinária, encontros familiares, associativos e institucionais, desportos e golfe.
Venha experienciar e conhecer melhor estas paisagens e ambientes da Arrábida com o programa Ao Sábado nas Quintas, da Associação dos Amigos do Jardim Botânico da Ajuda (AAJBA), que promove visitas mensais.
Leia também “Jardins públicos oitocentistas, a norte”
Saber mais em:
ww.monumentos.gov.pt
PIMENTEL, Joaquim Cortez, A Quinta da Conceição em Azeitão, in O Azeitonense, n.º 5, fevereiro 1984;
CALADO, Margarida, A Quinta da Conceição de António Cremer – Breve análise, in Claro-Escuro, n.os 2-3, Lisboa, maio a novembro de 1989;
PIMENTEL, Joaquim Cortez, Arrábida. História de Uma Região Privilegiada, s. l., 1992;
CALADO Margarida, Azeitão, Lisboa, 1993
Fotografias cedidas por Quinta da Conceição.
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