A revista americana Journal of Japanese Gardening, que circula por 37 países, faz uma sondagem anual aos seus leitores inquirindo qual o jardim mais bonito do Japão. Há nove anos que o Adachi, em Yasugi, na perfeitura de Shimane, vem classificado em primeiro lugar. Como passei quase todo um mês no Japão, desta vez não resisti, e resolvi ir com uma amiga japonesa visitar o tão famoso jardim. A partir de Kyoto, uma hora de Shinkansen (o comboio superrápido japonês) até Okayama, mais duas horas em comboio normal até Yasugi, mais 20 minutos de autocarro até ao dito jardim, foi o tempo que demorei para lá chegar.
O Adachi foi construído em 1970, por iniciativa de Adachi Zenko (1899-1990), que resolveu pôr Yasugi, uma pequena vila anónima perto do lago Nakaumi, na rota dos lugares mais visitados do Japão, exclusivamente pelo impacto do seu jardim. Numa área de 18 hectares, foi construído um Museu, com uma respeitável coleção de pinturas japonesas e, em volta dele, o jardim, concebido pela mão do mestre paisagista Nakane Kinsaku (1917-1995), embora com um grande envolvimento direto do seu patrono.
Uma visita sublime
O primeiro impacto que se tem é a sensação de que estamos perante uma composição perfeita: tem todos os princípios e elementos de um jardim japonês, com árvores, pedras e areia trazidas especialmente de todo o Japão, não se tratando de um jardim, mas de vários jardins.
Ao longo do edifício do Museu, vai-se desenrolando o espetáculo do Jardim Seco (kare san sui), do Jardim do Lago; do Jardim da Areia Branca e do Pinheiro (cópia de um masterpiece de Taikan exposto no Museu); e do Juryu-An, com o seu pavilhão para a cerimónia do Chá. Foi a grande interligação, característica no Oriente, entre a pintura e os jardins, que presidiu à conceção do Adachi.
Nas palavras do seu atual diretor, Adachi Takamori, neto do fundador, “quando os nossos olhos se desviam de uma pintura e não encontram harmonia, a experiência da obra de arte fica arruinada, mas se se estiver rodeado de um suave murmúrio de água, da verdura das árvores e da beleza da areia branca, a visita ao museu torna-se algo de sublime”. E assim, o Adachi é um espaço estético onde, não só se usufrui da arte como se contempla a beleza natural.
Imaculado
Grande parte do jardim é visto a partir do Museu através de enormes vidros. Estes oferecem ao visitante uma constante paisagem de perfeição, embora também haja um percurso exterior por onde se pode passear e examinar de perto todos os seus detalhes.
Rodeado de uma Natureza intocada, o Adachi tem um espetacular elemento de shakkei – ou paisagem “emprestada”-, que é o aproveitamento das vistas para além do jardim, de forma a enquadrá-lo, e dar-lhe uma dimensão aparente que vai muito para além da realidade.
Embora os jardins japoneses, especialmente em Kyoto, se encontrem num impecável estado de conservação, o Adachi ultrapassa tudo o que se possa imaginar. Tem sete jardineiros permanentes, mas todo o pessoal do museu está envolvido na sua manutenção com um trabalho diário no jardim. É imaculado. Não há uma folha, ou mesmo uma areia fora do sítio. Impressionante.
Porque é um jardim novo, falta-lhe aquela pátina única dos jardins dos templos de Kyoto, que apenas 200 ou 300 anos de manutenção dedicada podem conseguir. Nas palavras de Ogawa (1860-1933), considerado um dos melhores arquitetos paisagistas japoneses “os jardins recentes podem ser muito bonitos, mas só atingem a perfeição com a idade”. É o wabi sabi, um conceito estético Japonês no qual a Beleza é só alcançada com a passagem do tempo.
Para mim, o único defeito do jardim é o facto de o edifício ter uma arquitetura pesada e datada, que nem a quantidade de vidro consegue disfarçar. Um jardim japonês tem que ser observado de uma varanda, seja de um templo, de uma casa particular ou de um pavilhão de chá. Em qualquer estação do ano, um dos seus grandes encantos é o facto de haver sempre uma continuidade entre a estrutura arquitetónica e a Natureza.
As quatro horas de visita que lá passei foram bem retemperadas no fim do dia quando pernoitei no ryokan Saginoyusou. De magnífica gastronomia, e com a vantagem de ser um Roten Buro (espaço exterior de água termal, cavado na pedra), a dois passos de distância. Melhor é impossível.
Fotos: Vera Nobre da Costa
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