Frutícolas

Conheça a árvore da vida

A famosa palmeira tamareira ou Phoenix dactylifera

Diz o antigo ditado árabe que esta palmeira, mais conhecida como palmeira tamareira, atinge a absoluta felicidade com “os pés mergulhados em água e com a cabeça no fogo dos céus”, aludindo-se naturalmente aos extensos e cálidos desertos da península Arábica e Médio Oriente como a sua morada de eleição.

A palmeira Phoenix dactylifera é também conhecida em paragens mais distantes na terra de desertos sem fim, do povo berbere e beduínos nómadas, como árvore da vida, da abundância e da riqueza.

O que são as palmeiras?

Importa esclarecer inicialmente, por uma questão de rigor botânico, que as nossas estimadas palmeiras não são efetivamente árvores, mas antes plantas com maior afinidade às Herbáceas ou vulgares ervas do que às árvores. Têm uma classificação específica com a sua família própria, a das Arecaceae, sendo assim melhor classificadas como plantas perenes, lenhosas sem crescimento em termos de diâmetro de tronco e, nalguns casos, arborescentes. Com uma vasta e enriquecida história e presença assegurada em mitos e fábulas, estas palmeiras tiveram direito a ser personificadas, assumindo naturalmente o papel de personagens tanto masculinas como femininas. São parte integrante e indissociável de lendas e histórias de folclore tribal que retratam estas belíssimas plantas como seres sociais com consciência própria, cumprindo papéis na luta contra as adversidades e dificuldades na luta pela sobrevivência diária como os seus parceiros humanos.

Nos últimos 7000 anos, esta espécie de palmeira prosperou e florestou áreas em diversas latitudes no Oriente Médio, em climas e solos árduos, de fraca precipitação, e de grande variação de amplitudes térmicas diurnas/noturnas, tendo servido de enorme importância no passado como base de alimentação e abrigo devido aos seus frutos nutritivos de fácil preservação para viajantes, beduínos nómadas e marinheiros em travessias longínquas pelos oceanos.

As múltiplas utilizações da palmeira tamareira

Ainda hoje tem um papel preponderante em várias paragens no globo pelos seus deliciosos frutos e como fonte de matéria-prima nas mais diversas áreas, desde a cosmética à construção e produção de fibras naturais. Correntemente existem em cultivo 37 variedades de Phoenix dactylifera que são utilizadas como fonte de matéria-prima para utilizações que variam desde utilizações mais convencionais, como produção de pasta (agwa), palmito, xaropes, alternativa a açúcar de cana, sap ou seiva e sumo (nabigh), até autênticas pérolas de engenho e resiliência, como vinagre, fermento e leveduras naturais para fabrico de pão, assim como uma essência de perfumaria conhecida como Água de Tara, uma essência extraída das inflorescências masculinas desta lindíssima palmeira.

A palmeira-tamareira é uma planta arborescente, perene do tipo dioica, que, ao contrário das variedades monoicas, que contam na mesma planta com inflorescências de ambos os sexos, estas apenas existem na Natureza como exemplares ou masculinos ou femininos. Como tal, o seu processo reprodutivo torna-se de facto um complexo evento coreografado. As palmeiras masculinas atingem a maturidade primeiro e produzem inflorescências espetaculares que produzem pólen, enquanto as árvores femininas possuem inflorescências mais tardias que, caso sejam polinizadas, irão produzir o tão desejado fruto as tâmaras.

As tâmaras

Os frutos tâmaras como são sobejamente conhecidas constituem a principal razão do seu cultivo tanto no passado como na atualidade. As tâmaras são colhidas e processadas de variadíssimas formas, dado a sua capacidade de armazenamento e conservação de longa duração fazer delas uma fonte de nutrientes extremamente versátil e essencial para determinadas populações isoladas geograficamente. As tâmaras em conjunto com o leite de camelo formaram o pilar nutricional basilar do povo beduíno durante milénios.

Na Epopeia de Gilgamesh, sem dúvida o mais reputado dos poemas da Antiga Mesopotâmia, refere-se a importância fulcral desta fonte de alimento:

“E não amavas tu, Ishullanu, o jardineiro do palmeiral do teu Pai? Ele trouxe-te diligentemente cestos carregados de tâmaras sem fim, todos os dias providenciou a tua mesa.”

Este trecho de um poema, escrito cerca de 3000 a.C., é amplamente considerado um dos primeiros fragmentos de literatura escrita no mundo e retrata de forma poética com precisão as cestas pejadas de doces e suculentas tâmaras providenciadas pelas palmeiras e o seu jardineiro como pilar fundamental da alimentação da época. O ditado atribuído ao profeta Maomé, segundo o qual “uma casa com uma palmeira tamareira nunca passará fome”, constitui igualmente uma evidência da importância desta árvore para a subsistência e sobrevivência do povo árabe.

A relação simbiótica entre a palmeira tamareira e o homem

Nos primórdios da península Arábica, a relação entre a palmeira tamareira e o ser humano teve uma natureza de estreita simbiose, dado não ser possível a vida de um sem o outro. As palmeiras dependiam inteiramente do Homem para assegurar a sua sobrevivência, para as manter vivas num clima extremamente árido, cuidando delas, irrigando-as e podando-as, tal como, do mesmo modo, o Homem dependia da palmeira para alimentação e abrigo. Na realidade, a Phoenix dactylifera é uma planta arborescente que no seu estado selvagem pouco tem a ver com a visão a que estamos acostumados, sendo de facto uma palmeira de múltiplos troncos e de brotos laterais muito ramificados, que lhe dão a aparência de um arbusto, e não a versão de árvore alta, de tronco único tal comos as suas congéneres do género Phoenix, como a muito conhecida e cultivada Phoenix canariensis.

De facto, através da manipulação humana realizada através de consecutivas podas, da folhagem mais rasteira e da constante remoção de brotos laterais, o crescimento desta palmeira foi incentivado a progredir em altura, afastando-se do solo, ajudando a prevenir infestações de insetos e predação animal ruminante em paragens com muita escassez de material vegetal, e assim, inconscientemente, foram-se criando na sombra destas majestosas plantas as condições favoráveis a um microclima que veio a conduzir a outras possibilidades de cultivo mais produtivo na sua base.

A sombra é sem dúvida um dos mais importantes subprodutos destas majestosas plantas arborescentes, pois, com as suas frondosas copas, providenciam proteção dos climas duros e adversos típicos destas localizações. O seu ensombramento permite uma maior proteção para o Homem e os animais, sendo fulcral para a introdução de novas culturas que sustêm a vida nestas geografias remotas, bem como uma substancial redução de outros fenómenos meteorológicos adversos, como tempestades de areia e erosão pelo vento.

É nos meandros desta luz filtrada sob as suas copas, muitas das vezes irrigadas por complexos canais escavados manualmente (falaj), que outras culturas se multiplicam por encontrarem aí as condições necessárias à sua existência e manutenção. Pomares de citrinos, alfafa, melancias, batata-doce, variedades de feijão, algodão, trigo, cevada e milhete grassam as terras, permitindo que gado como vacas, ovelhas e cabras pastem onde não existia antes condições de manutenção de vida bovina, ovina e caprina, que são de elevadíssima importância para a variedade e completude dietética das populações nativas, providenciado uma fonte nutricional secundária e fornecimento ainda de outras matérias-primas como couro, lã e leite. Adicionalmente, a plantação destes verdadeiros oásis junto a edificações para habitação permite reduzir as temperaturas no seu interior abaixo dos 30 ºC, facilitando a vida neste clima inóspito e adverso, providenciando também uma filtração significativa do ar em ambientes desérticos naturalmente empoeirados.

É também ainda notável a sua utilização como matéria-prima de construção, pois, além da sua sombra, conforme referido acima, empregam-se as suas fibras na tecelagem de cobertas de janelas, quase como as nossas ocidentais janelas de vidro, assegurando uma correta ventilação e reduzida penetração solar, aliada a uma superior filtragem de partículas de pó que, através das suas microscópicas fibras, conseguem aprisionar partículas indesejadas de forma mais eficiente e eficaz do que matérias sintéticos da atualidade. Esta relação simbiótica entre Homem e árvore é uma das mais expressivas na Natureza, sendo sempre objeto de uma relação íntima e representa ainda nos dias correntes um vínculo ancestral de sobrevivência e afinidade, não só como árvore da vida, como um pilar do credo social do golfo Arábico.

CURIOSIDADES

A melhor tâmara do mundo e a palmeira mais rara em todo o continente norte-americano

Ao contrário do que poderia ser imaginado, as tâmaras consideradas as melhores do mundo não são originárias do golfo pérsico nem do local onde são endémicas as populares e caras tâmaras Medjool. São sim uma variedade extremamente rara chamada Black Sphinx. Por incrível que pareça, estas raridades peculiares (apenas 300 plantas no mundo) são encontradas apenas numa rua da cidade do Arizona, Mountgrove, EUA, e suspeita-se serem descendentes diretas da variedade Hayani.

Reza a lenda que as sementes ancestrais viajaram do norte de África para a América em 1919, junto de um expatriado, tendo algumas das sementes milenares germinado, por descuido acidental, numa residência em Phoenix.

Após o insólito achado, o etnobotânico Robert Metzler e seu sócio Frank Brophy adquiriram prontamente os brotos e propagaram-nas. Durante os anos 1950 e 1960, estas autênticas raridades foram de conhecimento e consumo restrito a celebridades e políticos de renome, nomeadamente o presidente Eisenhower, Bill Crosby e Lady Bird Johnson entre outros. São descritas na Arca dos Sabores (Ark of Tastes) Slow Food USA, uma lista de comidas e sabores significativos e em extinção.

A PALMEIRA MAIS VELHA DO MUNDO

Durante escavações arqueológicas, no Médio Oriente, foram recolhidas seis sementes, aparentemente de Phoenix dactilifera, que se encontravam excecionalmente bem preservadas dentro de uma ânfora. Após testagem radiocarbónica, apurou-se que as referidas sementes haviam permanecido dois milénios subterradas num túmulo.

Acontece que as ilustres desconhecidas eram antes seis sementes da extinta palmeira tamareira da Judeia e foram postas a germinar pela cientista Sarah Sallon. Os seus nomes são Adam, Jonah, Uriel, Boaz, Judith e Hannah. Por incrível que pareça, uma delas acabou efetivamente por germinar, sendo batizada com o nome Methuselah (Matusalém), personagem bíblica que viveu até aos 969 anos de idade, marcando assim o regresso à existência da palmeira tamareira da Judeia da lista de espécies extintas.

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