Jardins & Viagens

Miho, o museu paisagem no Japão

A entrada para o Miho

Andava há alguns anos a querer visitar o Museu Miho em Shigaraki, a cerca de hora e meia de Kyoto. No entanto as minhas estadias no Japão nunca coincidiam com a temporada de abertura do Museu. É que o Miho é um Museu muito especial, que se situa numa zona isolada e montanhosa, e só está aberto parte do ano.

Origem do museu

Trata-se de um Museu privado cuja proprietária, Mihoko Koyama, é detentora de uma vasta fortuna com a qual acumulou uma belíssima colecção de arte (patente no Museu) e fundou a religião Shumei em 1970 de que é a leader espiritual.

Há árvores no interior do Museu

Proprietária de uma enorme área na prefeitura de Shiga, lá erigiu um templo para acolher os fiéis da seita Shumei, e, em 1997, realizou o sonho de erigir um Museu que, não só albergasse a colecção de arte, mas constituísse em si uma peça arquitectónica perfeita, totalmente integrada na paisagem. Para isso contratou I.M.Pei, o famoso arquiteto chinês da discutida “pirâmide do Louvre” para projectar a obra não se olhando a despesas (diz-se que o Museu custou um quarto de bilião de dólares) para esta verdadeira obra de arte arquitectónica.

A entrada cinematográfica do Museu com uma janela que parece um biombo japonês

A obra de arte de Pei

Pei estudou as características do local e apercebeu-se logo de várias dificuldades. Deparou-se com um terreno muito montanhoso, com existência de um desfiladeiro no local. Além disso, a prefeitura de Shiga não autorizava o corte de árvores que levasse a uma alteração da paisagem. Não importa, a fortuna de Mihoko Koyama e o talento de Pei fizeram o milagre: um Museu totalmente integrado na paisagem inspirado num poema chinês do séc. V “A Primavera dos Pessegueiros em Flor”.

Um jardim seco no interior, outra referência ao Japão

Este poema descreve a descoberta que um humilde pescador fez de um maravilhoso campo de pessegueiros em flor onde se avistava uma entrada de gruta. Curioso, o pescador saiu do barco e resolveu explorar a tal gruta ao fundo da qual espreitava um raio de luz. Andou, andou, até que, à saída da gruta, deparou com uma lindíssima aldeia onde viviam, felizes, os Imortais entre flores, árvores e rios.

A aldeia chamava-se Shangri-La e o pescador por lá ficou uns tempos encantado com o entorno e com os habitantes que usufruíam de Felicidade eterna. Quando voltou a casa, contou a toda a gente a experiência que tinha vivido, e, como tinha marcado o caminho pensou que podia lá voltar. Mas, por mais que procurasse, o percurso de retorno nunca foi encontrado. Assim, Shangri-La transformou-se até hoje num mito das nossas imaginações, como sendo um lugar de Harmonia e Perfeição.

O caminho de “ weeping cherry trees ”, cerejeiras de ramos caídos, que ainda não estavam em flor

A integração na paisagem

O caminho até ao Museu é como o percurso do pescador. Deixam-se os carros num parque fora do Miho para não conspurcar o Museu, e vai-se a pé por entre cerejeiras (estamos no Japão) em vez de Pessegueiros. Após o percurso, encontra-se um túnel, em curva para manter a incerteza da saída, mas que permite ver um raio de luz. No fim do túnel, Pei construiu uma ponte de  passagem por cima do tal desfiladeiro e, finalmente, avista-se o Museu.

O Miho também é um poema. Uma arquitectura perfeita, aliada a um entorno sem mácula, de plena Natureza. Só se vê o verde das árvores, o ondulado das montanhas, e o silêncio é total apenas interrompido pelo chilrear dos pássaros.

O espectacular túnel de aço

Os materiais usados são do melhor. O túnel é todo em aço, tal como a cobertura do Museu, que tem as salas de exibição subterrâneas para não elevar demasiado o edificado e manchar a paisagem. Apenas as áreas de recepção, restaurante, etc. é que se encontram acima do solo permitindo ao visitante desfrutar do exterior através da utilização de vidro que permite total transparência.

A cafeteria do Miho aberta para a paisagem

O efeito de tudo isto é de cortar a respiração. De tal maneira que passei a tarde inteira no Miho. Nem sabia muito bem do que gostava mais. Se das iguarias que provei do restaurante; se da colecção de arte da Mihoko Koyama; se da exposição temporária de 350 máscaras Sarugaku (termo usado para o teatro clássico japonês Noh e Kyogen); se da arquitectura, que tão bem se harmoniza com a paisagem.

Tal como o pescador, fiz, contrariada, o caminho de regresso até ao carro. Para a Senhora Mihoko e para os visitantes o Miho é um bocadinho um Shangri-La.

Fotos: Vera Nobre da Costa

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