Jardins & Viagens

As primeiras jardineiras do Real Jardim Botânico de Kew

Março é sempre um mês especial. Começa a primavera e festeja-se o Dia da Mulher e o Dia da Árvore. Nesta edição, o destaque vai para o contributo das mulheres que marcaram a história do Real Jardim Botânico de Kew, reconhecido como um dos maiores centros de conhecimento da botânica no mundo.

Na edição de março do ano passado, contámos a extraordinária história de Marianne North, uma mulher que no século XIX decide, contra todas as convenções, fazer aquilo de que mais gostava na vida, viajar e pintar.

Entre 1871 e 1885, Marianne North percorreu o mundo em busca do registo de espécies exóticas e de paisagens, produzindo mais de 800 pinturas, que se encontram expostas, desde 1881, numa galeria com o seu nome, inteiramente idealizada e financiada por si, no Real Jardim Botânico de Kew, em Londres. O seu legado, além da arte, contribuiu para o avanço do conhecimento científico na flora e fauna.

Mas houve outras mulheres que ficaram na história de Kew. Apesar de ter sido durante a primeira Grande Guerra Mundial (1914-18) que muitas mulheres tiveram de desempenhar o importante papel de substituir os homens que tinham partido para a guerra, o primeiro registo de mulheres jardineiras no “Kew Guild” data de 1896. Formadas pela Escola de Horticultura para Mulheres, em Swanley (Kent) e “apelidadas de Kewriosities” pela imprensa londrina, Annie M. Gulvin e Alice Hutchins foram as primeiras mulheres contratadas pelo diretor William Thiselton-Dyer e com um salário igual aos dos homens, décadas antes de lhes ter sido concedido o direito ao voto.

Capa da revista Illustrated, de 9 de maio de 1942. (imagem de domínio público)

Embora fosse possível as mulheres pagarem para aprenderem horticultura, esta foi a primeira vez que puderam receber um salário pelo seu trabalho. Conhecido por ser um disciplinador, Thiselton-Dyer introduz os uniformes para jardineiros como um símbolo de status e para impor a ordem no local de trabalho. As jardineiras tinham de usar o mesmo uniforme dos homens “para não distrair os colegas do sexo masculino enquanto trabalhavam”, dizia-se.

Desde 1902 até o início da primeira Guerra Mundial, não houve registo de mulheres a desempenhar trabalhos de jardinagem. Foi então que aquele jardim londrino chegou a contar com mais de 30 jardineiras, algumas permaneceram até 1922, ano em que o emprego das jardineiras foi interrompido.

As mulheres vieram a ser recrutadas novamente durante a Segunda Guerra Mundial pelos mesmos motivos que na guerra anterior e muitas trabalharam até 1946. No início da década de 1950, o recrutamento era feito à razão de uma ou duas por ano, até a década de 1970, quando seu número aumentou para se igualar ao dos alunos do sexo masculino.

Na esfera científica, é mais difícil rastrear o emprego das mulheres, mas sabe-se que este aumentou de forma constante desde o início do século XX, sobretudo depois de 1915. No entanto, foi na década de 1950 que as mulheres cientistas adquiriram um papel mais proeminente, especialmente após a lei que as autorizava a permanecer após o casamento.

Página da revista Illustrated, de 9 de maio de 1942. (imagem de domínio público)

Em Kew, foram muitas as mulheres notáveis no mundo da botânica. De referir: Elizabeth Blackwell (1707-1758), que, em 1757, foi a primeira mulher a publicar o nome de planta, sob o sistema de nomenclatura binomial criado por Lineu; Sarah Anne Drake (1803-1857), especialista em orquídeas; Marianne North (1830-1890), pintora botânica; Beatrix Potter (1866-1943), escritora e ilustradora que estudou e conduziu experiências sobre a reprodução e o desenvolvimento de fungos; Elsie Wakefield (1886-1972), micologista e ilustradora; Margaret Mee (1909-1988), botânica britânica que se especializou em plantas da floresta amazónica e uma das primeiras pessoas a chamar a atenção para o seu desmatamento.

Acreditamos que a melhor forma de celebrar o Dia da Mulher hoje é inspirando todas as mulheres desta e de gerações futuras, dando a conhecer realizações notáveis.

CURIOSIDADES

1. Annie Gulvin, Alice Hutchings, Gertrude Cope Eleanor Morland, formadas na Escola de Horticultura de Swanley, foram as primeiras mulheres jardineiras em Kew.

2. As primeiras jardineiras de Kew eram apelidadas pela imprensa londrina de Kewriosities.

3. Gertrude Cope, depois de trabalhar em Kew, passou a trabalhar com outra jardineira pioneira, Miss Harrison, nos jardins da propriedade de George Cadbury, perto de Birmingham.

4. Harriet Margaret Louise Bolus (1877- 1970), desde 1913 até 1969, publicou mais de 2200 novos nomes de espécies, sendo a mulher com o maior número de publicações de plantas.

Com a colaboração de Teresa Vasconcelos.

Referência bibliográfica:

Brewer, G. (2020). Women who transformed the world of plants and fungi | Kew. Kew Royal Botanic Gardens. https://www.kew.org/read-and-watch/celebrating-women-international-womens-day

Losse, M. (2017). Lady gardeners of the 19th & 20th century | Kew. Kew Royal Botanic Gardens. https://www. kew.org/read-and-watch/lady-gardeners-of-kew Hopkinson, M. (2014). Women gardeners during the First World War | Kew. Kew Royal Botanic Gardens. https:// www.kew.org/read-and-watch/women-gardeners- during-the-first-world-war

International Women’s Day: Trail-blazing women of Kew. (2019, March 8). BBC News. https://www.bbc.com/news/science-environment-47463053

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